sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Confusão de grelos, e Cristianismo

 

Quando comentamos textos incongruentes, estamos a alimentar a visibilidade da incongruência. Muitas vezes, a incongruência é utilizada como um meio para atingir qualquer fim; outras vezes, a incongruência é concebida como um fim, em si mesma. No primeiro caso, é ideologia; no segundo, é estupidez.

Portanto, não costumo comentar textos incongruentes, a não ser em casos excepcionais em que estou convencido de que se trata de ideologia, e não somente de estupidez. Parece que o autor deste “post” é licenciado em História, e por isso parto do princípio de que não escreveu o que escreveu devido à sua ignorância: o que ele faz é deturpar propositadamente os factos históricos, o que revela desonestidade intelectual — a não ser que tenha tirado o curso de História “à pressão”.

A religião e a cultura judaicas são tudo menos submissas. Aliás, a justiça de Talião é de origem judaica. Portanto, qualquer identificação — como o escriba em questão faz — entre a cultura judaica e o Cristianismo é absurda.

Por outro lado, a identificação entre o Islão e o Cristianismo, como faz o escriba, não pode ser ignorância: só pode ser deturpação ideológica. Finalmente, as considerações sobre o Cristianismo revelam um visão retorcida (propositadamente, penso eu; porque não concebo que a incongruência seja própria de alguém que não conhece os factos históricos) da História do Cristianismo.

Parece-me que o escriba não conhece a História do Cristianismo. E não cabe aqui, neste verbete, descrevê-la exaustivamente, não só porque não há espaço, mas também porque um resumo poderia ser mal interpretado.

nietzschePor exemplo, o Cristianismo nunca baniu as hierarquias sociais senão perante Deus: segundo o Cristianismo, o nobre continua a ser nobre, o servo continua a ser servo, e apenas são iguais perante Deus — o que retira ao poderoso a total discricionariedade de acção perante o mais fraco, por um lado, e institui, por outro lado e pela primeira vez na História, o conceito de Direito Natural que é a base da civilização europeia, e que conduziu ao conceito de Notrecht de Hegel.

O primeiro defensor do Direito Natural (entendido de uma forma integral, e não apenas fragmentária) foi talvez Jesus Cristo. O Direito Natural não implica a necessidade do suicídio; pelo contrário, implica o princípio da auto-conservação. Jesus Cristo (tal como Sócrates, o ateniense) foi condenado à morte pela suas ideias; não se suicidou.

A ideia do escriba segundo a qual “o cristão deve procurar o martírio” (a morte), revela o seu desconhecimento da história do catolicismo. Em vez de escrever asneiras, deveria instruir-se. Mas não há qualquer argumento racional que demova o escriba da sua visão ideológica nietzscheana e niilista, à moda do PNR (Partido Nacional Renovador). E por isso é que este partido político não tem (felizmente) qualquer implantação política em Portugal, porque não tem qualquer aderência à realidade.

Rebater aquele texto, ponto por ponto, é uma tarefa penosa. Como escreveu Olavo de Carvalho: “A mente humana é constituída de tal forma que o erro e a mentira podem sempre ser expressos de maneira mais sucinta do que a sua refutação. Uma única palavra falsa requer muitas para ser desmentida.”

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